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Do tempo livre à libertação do tempo

Pe. Tolentino Mendonça e Paulo Vale
Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura
Agosto 2008

Com vista a uma reflexão sobre a forma como se vive o tempo livre e se usufrui desse espaço liberto, o Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura publicou no início do Verão um documento que serve de provocação à forma como a sociedade entende o tempo.

«Do tempo livre à libertação do tempo» é o nome do livro apresentado pelo director do SNPC, o Pe. Tolentino Mendonça. Um texto escrito pelo director e por Paulo Vale, membro desta equipa do SNPC, liderada por S. Manuel Clemente, Presidente da Comissão Episcopal da Cultura, Comunicações Socais e Bens Culturais da Igreja.

“O tempo só é livre quando realmente liberta”, escreve o Bispo do Porto. O Pe. Tolentino indica haver uma exigência na “vivência do tempo livre”, que actualmente é olhado como “um produto de consumo, ou como um pacote que a indústria do entretenimento nos vende”. Todas são possibilidades com valor, mas é importante que seja cada pessoa a dizer o que quer e o que precisa. “E assim, a viver com exigência os seus tempos de lazer”, aponta o sacerdote.

O documento apresenta uma reflexão sobre o tempo livre e o uso dessa liberdade. Uma proposta feita pela igreja depois de ouvidos muitos intervenientes no pensar e no agir dos tempos livres. Questionar e fazer questionar é o objectivo do documento. “É preciso que as pessoas tenham uma consciência crítica sobre o que fazem com o seu tempo, e façam, também uma selecção crítica das ofertas”.

O tempo livre é uma necessidade para que haja realização humana. O Pe. Tolentiono Mendonça explica que o tempo livre é hoje “um espelho da alma, do nosso tempo, das procuras, das esperanças, das necessidades, mas também das crises e da extrema fragilidade do viver”. Aqui se expressam os encontros e os desencontros, a capacidade de criação e a inevitabilidade de consumir e viver numa sociedade “que nos torna espectadores e não sujeitos activos da própria criação”.

Por tudo isto, a reflexão sobre o tempo livre é, à luz do documento, não só obrigatória e urgente, mas um imperativo para a compreensão de uma dimensão antropológica fundamental. O tempo livre é visto como um grande reservatório de esperança e expectativas.

“Vivemos numa sociedade de produção, onde o trabalho é um meio indispensável à sobrevivência, mas numa sociedade hiper activa, o tempo livre e de lazer acaba por ser o espaço de projecção de todos os sonhos, necessidades e vontades adiadas. O tempo livre é um reduto da humanidade porque concentramos ai tudo o que não conseguimos nas outras dimensões da vida”, explica.

Os tempos livres podem ser uma hora, um mês, pode ser um tempo mais dilatado ou mais diminuto, mas o que importa “é a qualidade do que se vive e se partilha”.

O documento deixa ainda clara a ideia de que o lazer não pode ser um exílio ou uma tentativa de enviar a pessoa para fora de si mesma. “Terá de ser um encontro de cada um com a sua própria história”, explica o sacerdote.


“Todos vivemos numa sociedade onde não se tem em conta as necessidades destes tempos de qualidade. O que importa é consumir, ser utente e passar pelas coisas. Fomenta-se pouco um «estar» que seja também uma forma de «ser», uma forma de realizar a própria existência”.

A realização pessoal na alegria e na glorificação é a proposta do Cristianismo, mesmo que nem todos o vejam assim. “Uma das acusações que se faz ao Cristianismo é dele ter reduzido o espaço da alegria. É uma falsa acusação. Devemos mostrar isso, primeiro pelas nossas vidas”.
O Pe. Tolentino Mendonça recorda que o filosofo Kierkegaard afirmava que a alegria era o grande segredo do Cristianismo. “Não uma alegria pelas coisas secundárias, pois uma alegria no imediato pode significar uma tristeza pelas coisas eternas”, traduz o sacerdote.

A alegria expressa no documento é profunda e capaz de libertar. “O Cristianismo propõe não apenas uma alegria no imediato, mas também quanto ao destino do próprio homem e à consumação do mundo”. Assim, “a proposta cristã exorta uma vivência da própria glória. A experiência da glória passa por uma afirmação plena da história humana da nossa liberdade e da nossa capacidade de ser e fazer, marcando o tempo com qualidade é algo que está no centro da proposta cristã”.

As sociedades modernas afastam-se cada vez mais da noção de eternidade e quando este afastamento acontece é a própria vida que perde o sentido. O Pe. Tolentino chama a atenção para que se “perdemos um horizonte maior em relação à vida, é a própria vida que perde sentido”. Dessa forma, “quando o horizonte da eternidade fica distante e fora das expectativas quotidianas é o próprio dia-a-dia que se ressente”.

Este documento inaugura uma nova marca editorial, «Cadernos do Sicómoro» que acompanhará outras publicações do SNPC. «Do tempo livre à libertação do tempo» é fruto das três primeiras jornadas da Pastoral da Cultura. Não é uma proposta para os tempos de férias, mas antes uma provocação para outra forma de estar e viver a vida.


in Ecclesia

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